quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

Nem todo policial é um otário fardado, nem todo malandro é um mal necessário.

Há oito anos, quando comecei a conhecer um pouco melhor Nichteroy, fui logo avisado sobre os perigos do Cavalão. "Favela braba, igual às piores do Rio."

Voltei a ouvir sobre o Cavalão nesse fim de semana, na sensacional reportagem da Regina Casé pro Fantástico. Ela mostrou como é possível, com boa vontade, trabalho e respeito, resolver um dos maiores problemas da nossa cidade.

O último registro de homicídio no Cavalão data de 2003. Desde então, morador algum ouviu sequer um tiro. E ninguém precisa de autorização do tráfico para entrar. A paz subiu o morro um ano antes, em 2002, quando foi instalado, bem no meio da favela, o Grupamento de Policiamento de Áreas Especiais (Gpae). Um "quartel" onde as crianças entram e saem, jogam bola, pegam frutas nas árvores. Tática de auto-proteção que viria a ser também um dos alicerces de uma nova relação entre a comunidade e a Polícia Militar. Como mostrou a Regina, no Cavalão homens, mulheres e crianças sabem os nomes dos policiais. Os respeitam. E os têm como gente de confiança.

Nem sempre foi assim, claro. Durante mais de vinte anos, o Cavalão foi o morro mais violento de Nichteroy, com uma rotina de tiroteios e mortes praticada pelo movimento, que hoje não existe mais de forma organizada no morro.

"Estaria mentindo se dissesse que ninguém vende ou compra droga aqui", diz o comandante do Gpae, o capitão Romeu. "Mas não existe mais o tráfico enquanto dono do morro, ditando ordens e executando pessoas".

Lembro de novo: já são quatro anos sem um único tiro ou homicídio no Cavalão.

E o mais incrível é que a instalação do Gpae no morro foi uma resposta a uma denúncia de violência policial - em setembro de 2002, oito policiais foram presos pela tortura e morte do ajudante de pedreiro Francisco Aldir de Souza, que tinha 18 anos. E, claro, não era traficante. Dois ônibus foram queimados pela comunidade em protesto. O tráfico mandou fechar o comércio no morro. Mas aquela seria a última vez.