quinta-feira, 1 de novembro de 2007

O que você vai ser quando você crescer...

Ainda me lembro da primeira vez que fui sozinho ao Maracanã, tinha doze anos. Naquele tempo, tempo bom, sonhava com uma carreira de jornalista esportivo e invejava profundamente aqueles que, como eu, estavam sempre lá - mas sem pagar e vendo o jogo da então tribuna de imprensa.

Ainda me lembro da primeira carteirinha da ACERJ que recebi, logo depois de ser contratado e realizar o sonho da carreira. "Uau!", pensei. "Agora mesmo é que não saio mais do Maracanã".

Passaram-se nove anos até que eu usasse a tal carteirinha - já tinha uma coleção pendurada na porta do armário de casa quando pela primeira vez usei do direito de entrar sem pagar, mesmo não sendo pra trabalhar. O fato é que nunca gostei, nunca me senti à vontade. Em primeiro lugar, não dá pra entrar como imprensa de bermuda. Manto sagrado, claro, nem pensar. E ir ao Maraca sem vestir o manto é como ir à praia e não dar um mergulho.

Depois dessa primeira vez, que foi no ano passado, acompanhado de um pintor e um pedreiro conhecidos, mas que foram pra arquibancada, só voltei a usar a carteira no Flamengo x Asco, quando me aborreci tremendamente ao ter minha passagem pra arquibancada negada pelo simples fato de estar usando uma camisa do Flamengo por baixo da Hering branca. "Ordens do Pedro Costa". "Vocês vêm pra cá, não pagam, querem ir pra arquibancada... veio pra cá, é pra trabalhar."

Ainda tive que aturar essas e outras em tom de deboche. Logo quem, logo eu, olha só, que usei a porra da carteira, sem ser a trabalho, duas vezes em treze anos.

Por isso, ontem, depois do programa sair do ar, saí eu do Maracanã, onde estava trabalhando desde quatro da tarde, vesti o manto, saquei o ingresso e fui pra arquibancada encontrar meu irmão.

E aí, no meio do caminho, tinha a PM.

E branquinho ainda quer fazer Copa do Mundo aqui.

Em mais um show de incompetência, despreparo e, pra mim, total racalque, policiais montados em cavalos "organizavam" as filas de entrada, uma de cada lado. De tempos em tempos, travavam a fila. Tumulto. Empurra-empurra. Mulher passando mal. Cecetete pra cima de torcedor. Suor. Pés mal tocando o chão. O corpo sendo levado pela massa. Uma loira gostosa dando mole. Por sorte, cair no chão era improvável, diante do aperto.

Meia hora quase nesse sufoco. Até a alma ficou empapada de suor. E, já do lado de dentro, a visão da má vontade - gente pra caralho pra entrar ainda e a polícia, em vez de manter a ordem, dava o tom da desordem, transformando o que poderia ser uma entrada tranquila, sem as tais filas, numa tragédia em potencial. Porque pra alguém ser pisoteado ou ter um enfarto no meio daquela situação, não custava nada. Vi pelo menos meia dúzia de pessoas saindo das mega-filas passando mal.

Nosso problema é achar que aqui é a Suíça.

Mas aqui, definitivamente, não é. Aqui o cara sobe no assento pra ver o jogo. Quebra o assento, joga na torcida adversária, lá embaixo. Aqui, num jogo como o de ontem, setenta pessoas vão parar no atendimento médico, algumas pisoteadas em tumultos já dentro do Maracanã. Aqui, meus camaradas, não é a Suíça. E aqui, a polícia não é bem uma polícia.



Lá dentro, de novo, aquele fenômeno chamado Flamengo. Muito mais que um time, muito mais que um clube - uma nação. Só quem é sabe o que é.